Taxa de Erro de Bit e Avaliação de Desempenho no ISDB-T Analyzer

07/09/2025


Introdução

Na transmissão de dados digitais é inevitável a ocorrência de erros devido ao ruído, à atenuação do canal e a fenômenos como interferência e desvanecimento. Para quantificar esses erros utiliza‑se a taxa de erro de bit (Bit Error Rate – BER), definida como a proporção de bits recebidos incorretamente em relação ao total de bits transmitidos. O BER é pequeno quando a relação sinal‑ruído é alta e cresce quando o sistema está sujeito a ruído ou a uma propagação degradada

Outra grandeza essencial é o Eb/N0, a razão entre a energia por bit (Eb) e a densidade espectral de ruído (N0). Essa razão representa o SNR por bit e é a base para comparar diferentes esquemas de modulação e códigos de correção de erro. O valor de Eb/N0 indica quão forte é o sinal no receptor; cada modulação (BPSK, QPSK, QAM etc.) apresenta uma curva teórica de BER em função de Eb/N0. O objetivo deste artigo é apresentar de forma didática o conceito de BER, relacioná‑lo com Eb/N0 e descrever como esses conceitos foram implementados na ferramenta ISDB‑T Analyzer para prever o desempenho de diferentes configurações do sistema de TV digital brasileiro (ISDB‑T).


Conceito de BER

O BER expressa a qualidade de uma transmissão digital. Matemáticamente,

onde Ntotal é o número de bits recebidos incorretamente e Ntotal o número total de bits transmitidos. A ocorrência de erros depende de diversos fatores:

  • Relação sinal‑ruído (SNR): quanto maior o SNR (ou Eb/N0 ), menor será a probabilidade de erro. Em canais com ruído branco aditivo (AWGN), pequenas variações de Eb/N0  podem reduzir o BER em várias ordens de magnitude

  • Modulação: esquemas mais robustos como BPSK e QPSK são menos suscetíveis ao ruído do que modulações de ordem superior como 64‑QAM. A literatura mostra que, para valores fixos de SNR, modulações com maior número de símbolos apresentam BERs mais alto.

  • Codificação de canal: códigos de correção de erros adicionam redundância ao sinal, permitindo que o receptor detecte e corrija alguns erros. Na prática, a presença de codificação desloca a curva BER×Eb/N0 para a esquerda, proporcionando menor BER para o mesmo Eb/N0 . 

  • Condições de canal: além do AWGN, canais podem apresentar desvanecimento (Rayleigh, Rice) ou interferências, aumentando a taxa de erros. Para contornar a variação rápida de BER em canais com desvanecimento, simulações costumam calcular a média do BER em várias execuções, como é feito na ferramenta analisada.

Entender e prever o BER para diferentes parâmetros auxilia engenheiros a dimensionarem a potência de transmissão, escolherem a modulação adequada e definirem margens de atenuação. As curvas teóricas BER×Eb/N0 são o instrumento básico para essas decisões: elas mostram a taxa mínima de erros que um sistema consegue atingir em um canal AWGN e servem como referência para calcular o ganho de códigos de correção e outras técnicas.


Relação entre Eb/N0 e BER

O valor Eb/N0 representa o SNR por bit e se calcula dividindo a potência média do sinal (Ps) pelo produto da taxa de bits (Rb) e a densidade de ruído (N_0):

Essa razão é frequentemente expressa em decibéis. Para um receptor, medir Eb/N0 é útil porque independe do tipo de modulação e da largura de banda do sinal. A revista Spread Spectrum Scene explica que o Eb/N0 é a medida básica de quão forte é o sinal no receptor; diferentes modulações têm curvas de BER distintas em função de Eb/N0 e essas curvas indicam o melhor desempenho possível para um dado nível de potência. Por exemplo, em sistemas de quadratura (QPSK), uma BER de 10^6 normalmente exige um Eb/N0 ao redor de 11 d. Em geral, quanto maior a ordem da modulação (ex.: 64‑QAM), maior precisa ser o Eb/N0 para alcançar a mesma BER, pois os símbolos ficam mais próximos uns dos outros e são mais susceptíveis ao ruído.

Quando códigos de correção de erro são aplicados, o ganho de codificação desloca a curva BER×$E_b/N_0$. A ferramenta apresentada posteriormente estima esse ganho de forma analítica: o BER após a decodificação externa é calculado a partir do BER após a decodificação convolucional por meio de uma equação que simplifica a implementação.



Ferramenta ISDB‑T Analyzer

A ISDB‑T Analyzer é uma aplicação desktop desenvolvida em Python/Tkinter cujo objetivo é prever o desempenho do sistema ISDB‑T (TV digital terrestre brasileira) variando parâmetros de transmissão. O código está disponível em https://github.com/aragonxpd154/ISDBT-Analyzer e foi elaborado com tecnologias como Python 3.x, biblioteca gráfica Tkinter, NumPy, Matplotlib e Pillo. A aplicação possui as seguintes funcionalidades:


  • Seleção de parâmetros do sistema: o usuário escolhe o modo (1, 2 ou 3), o intervalo de guarda (razões como 1/8 ou 1/16), a modulação (QPSK, 16‑QAM ou 64‑QAM), a taxa de codificação (1/2, 2/3, 3/4, 5/6) e a profundidade de entrelaçamento. Esses parâmetros definem a ocupação espectral, a robustez e a taxa de dados do sistema.

  • Curvas teóricas BER×Eb/N0: o software gera curvas teóricas para cada modulação escolhida. Inicialmente calcula‑se a curva sem codificação, baseada na distribuição de probabilidade de erro para QPSK e QAM em canal AWGN. Em seguida aplica‑se um ganho de codificação aproximado para obter a curva "codificada". O usuário pode escolher o intervalo de Eb/N0 e o número de pontos da curva. O gráfico é exibido em nova janela com eixos em português, permitindo comparar visualmente a diferença entre modulações e o efeito do código.

  • Estimativa da taxa de dados: a ferramenta calcula a taxa de bits líquida (em Mb/s) a partir dos parâmetros selecionados. Essa taxa depende do modo de transmissão (número de segmentos), da modulação e da taxa de codificação, bem como do intervalo de guarda. O relatório do simulador evidencia que diferentes combinações de modulação e guarda resultam em larguras de banda úteis variadas, servindo para dimensionar serviços de vídeo e dados.


  • Simulação de transmissão de imagem: utilizando uma imagem de referência (um gradiente ou arquivo escolhido), a ferramenta simula a modulação e a adição de ruído AWGN. A imagem degradada correspondente a cada valor de Eb/N0 é exibida lado a lado com a original, permitindo ao usuário perceber a degradação visual conforme o SNR diminui. Esse recurso ilustra de forma intuitiva como a BER influencia a qualidade da TV digital.


  • Importância das curvas BER×Eb/N0 para avaliação de desempenho

    O relatório do simulador destaca que as curvas BER em função de Eb/N0 são fundamentais para avaliar variações de parâmetros e verificar o ganho de robustez obtido com diferentes modulações e códigos. Essas curvas permitem responder perguntas como:

    • Qual modulação oferece melhor compromisso entre taxa de dados e robustez para um serviço de TV móvel?

    • Qual ganho de codificação é necessário para atingir uma BER alvo?

    • Até que ponto se pode reduzir a potência de transmissão sem comprometer a qualidade de recepção?

    Ao combinar as curvas com as estimativas de taxa de bits, os projetistas podem dimensionar sistemas que atendam aos requisitos de taxa de vídeo, mobilidade e cobertura. Por exemplo, no padrão ISDB‑T, utilizar QPSK com taxa de codificação 1/2 oferece maior robustez para canais móveis, enquanto 64‑QAM com taxa 3/4 maximiza a taxa de dados para receptores fixos, mas requer SNR mais elevado. O simulador permite visualizar essas diferenças de forma gráfica e imediata.


    Conclusão

    A taxa de erro de bit (BER) é um indicador central na avaliação de enlaces digitais e sua relação com Eb/N0 fornece a base para comparar diferentes modulações e códigos de correção. Este artigo apresentou os conceitos fundamentais de BER e Eb/N0, destacando que a primeira expressa a fração de bits errados e a segunda mede o SNR por bit, sendo utilizada para derivar curvas de desempenho teórico.

    A ferramenta ISDB‑T Analyzer ilustra na prática esses conceitos, permitindo ao usuário selecionar parâmetros do sistema ISDB‑T, gerar curvas teóricas BER×Eb/N0, visualizar diagramas de constelação, simular a transmissão de imagens e calcular a taxa de dados. O uso de um laço de média para o cálculo do BER e a estimativa analítica do BER pós‑codificação demonstram estratégias de simulação eficientes. Por meio dessas funcionalidades, o simulador facilita o estudo do impacto do ruído, da modulação e da codificação no desempenho do sistema de TV digital terrestre brasileiro.


    Referências

  • Electronics Notes – Bit error rate tutorial. Este artigo define o BER como o número de erros em um fluxo de bits e explica que ruído e condições de propagação influenciam a probabilidade de erro. Também discute que modulações de ordem superior apresentam maior sensibilidade ao ruído e exigem maiores valores de Eb/N0 para o mesmo BER.

  • Spread Spectrum Scene – "Eb/N0 Explained". O texto destaca que Eb/N0 é a medida de SNR para sistemas digitais, definida como a razão entre energia por bit e densidade espectral de ruído, e que cada modulação possui uma curva BER×Eb/N0 . O artigo apresenta um exemplo de cálculo de Eb/N0 necessário para atingir BER=10⁻⁶.